Já se torna quase repetitivo, mas a verdade é para ser dita. A Cavalo de Ferro continua a brindar-nos com pequenas jóias que andavam esquecidas pelos editores nacionais e desta vez escrevo-vos sobre Victoria, um pequeno livro Knut Hamsun, escritor norueguês que em 1920 ganhou o Nobel e do qual já foram editados em Portugal Fome e Pan. Como se vê, a nível de títulos, parece parco em palavras e neste Victoria também o foi no resto, pois o romance não chega às 130 páginas. Mas as palavras foram escolhidas a dedo, pois as 125 páginas bastam para um excelente romance onde o tema do desencontro amoroso é abordado com um preciosismo que nos remete para paisagens e ambiente melancólicos de uma época distante.
Trata-se da típica história entre um rapaz de condição modesta e uma jovem de famílias ricas e de um estrato social inacessível ao primeiro. Ele chama-se Johannes e é filho de um moleiro. Ela é Victoria e pertence a uma família que em termos de fausto financeiro já conheceu melhores dias e que, portanto, se vê obrigada a casar com alguém que os salve da bancarrota. Este terceiro elemento é Otto. Conhecem-se todos desde pequenos, mas naturalmente cada um segue o seu caminho. Johannes vem a ser poeta e nunca esquece Victoria, que se torna a sua obsessão, apesar dos encontrso entre ambos serem escassos. Ela, tal como uma menina mimada, praticamente brinca com ele e com os seus sentimentos, mas na verdade não consegue esquecê-lo. Ele tenta tudo para ser aceite pela “entourage” dela, mas o dinheiro fala mais alto. Johannes refugia-se na sua poesia e na natureza, sentindo-se como peixe na água quando está no campo, tal como sucedia em criança, pois esse era o seu espaço de evasão, enquanto aspirava a uma vida melhor e a um amor puro. Mas nunca consegue dar o passo que o leve a passar a fronteira para o outro lado, para o mundo onde pode encontrar Victoria. Esta, volta e meia, desce ao mundo de Joahnnes, mas tão depressa lá surge como desaparece, não deixando rasto.
Tudo isto parece muito básico e previsível, estarão por certo a pensar, e não deixa de o ser, mas a verdade é que resulta numa obra belíssima, que prende o leitor, tornando o vulgar em irresistível, não só por estar bem escrito, mas principalmente por estar bem descrito e apresentado.
O “interior” das personagens está extremamente bem trabalhado e a grande densidade psicológica delas é um dos grandes trunfos (se não o principal) deste romance sobre o amor que sobreviveu ao tempo e que em boa hora chegou a Portugal.